Crise na Venezuela: O desespero dos que se prostituem na fronteira com a Colômbia

O desespero causado pela crise na Venezuela e a necessidade de encontrar uma forma de alimentar a família fizeram com que muitos venezuelanos se vissem forçados a fazer coisas que nunca imaginariam. Entre elas, trabalhar na indústria da prostituição.

Mulheres que se tornaram garotas de programa e organizações que lhes oferecem ajuda calculam que, atualmente, cerca de 80% das trabalhadoras sexuais em Cúcuta são venezuelanas.

Muitas (e muitos) estão em situação de vulnerabilidade tão delicada que se submetem a circunstâncias extremas, diz Miguel Ángel Villamizar, assistente social ligado à Fundación Censurados, uma ONG que presta apoio a imigrantes venezuelanos.

Grupos que ajudam imigrantes em Cúcuta afirmam que houve um aumento significativo da parcela de pessoas que oferecem serviços sexuais na cidade. O mais preocupante envolve menores de idade.

“Nunca tinha visto um índice tão elevado de participação de menores de idade na prostituição em toda a minha carreira no trabalho voluntário”, destaca Rafael Velásquez, encarregado da missão em Cúcuta do Comitê Internacional de Resgate (IRC, na sigla em inglês), que presta ajuda a vítimas de crises humanitárias.

Velásquez já passou por zonas de conflito em Darfur, na Somália, no Iêmen, na Nigéria e na República Centro-Africana.

Em uma pesquisa realizada pela organização, 27% dos ouvidos disseram ter sido abordados por desconhecidos que se ofereceram para levar seus filhos da Venezuela à Colombia oferecendo-lhes melhores condições de vida.

“Esse é um indicador de tráfico e de exploração infantil vinculado à prostituição. E a porcentagem é muito maior do que a que temos visto em outros contextos de emergência”, afirma Velásquez. Praticamente todos os entrevistados sabiam de algum caso.

A prática ficou muito mais visível: não apenas à noite, como de costume, mas também à luz do dia e em lugares nos quais antes não se encontrava prostituição.

“A situação piorou no último ano, agora a prostituição está em quase todas as esquinas. É doloroso e triste, parte o coração”, diz Rito Álvarez, da Fundación Oasis de Amor y Paz, que ajuda imigrantes na fronteira.

Outras variantes na forma de inserção dos migrantes na indústria sexual do lado colombiano envolve casais.

“São heterossexuais em que ambos trabalham na prostituição. A mulher atende os clientes de dia e o homem, à noite – dessa forma eles conseguem se revezar para cuidas dos filhos”.

Também há casos, acrescenta, em que deixam as crianças dormindo à noite e saem juntos para trabalhar até a madrugada.

“Atendem a quem quer que se aproxime, seja homem ou mulher”, diz ele.

O objetivo é ganhar dinheiro para mandar aos familiares na Venezuela, como fazem diversos venezuelanos que saíram do país, hoje imerso em uma profunda crise econômica que provocou um êxodo massivo reconhecido pela ONU, mas negado pelo governo ditador de Nicolás Maduro.

Sexo sem camisinha rende mais dinheiro

As ONGs que atuam no local identificaram outra prática recorrente entre as trabalhadoras sexuais em Cúcuta: concordar com uma relação sem preservativo para que os clientes paguem mais.

Muitas sabem dos riscos, ressalta Villamizar, mas dizem aceitar porque precisam de dinheiro.

“Elas fazem isso por sobrevivência. Comem uma vez por dia e tomam água para tentar enganar a fome. As condições em que exercem a prostituição são desumanas”, afirma uma pessoa que trabalha com imigrantes na fronteira e que pediu para manter o anonimato.

“As venezuelanas atendem até 12 clientes por noite e cobram muito menos. Algumas pedem entre 5.000 e 10 mil pesos por programa (US$ 1,60 e US$ 3,20, respectivamente), enquanto uma colombiana cobraria 50 mil pesos (US$ 15)”, conclui.

‘Pague 5.000 pesos e coma duas venezuelanas’

Não faltam aqueles que se aproveitam do desespero dos imigrantes venezuelanos.

“É horrível. Um dos bares da região tem o seguinte letreiro na entrada: ‘Pague 5.000 pesos e coma duas venezuelanas”, diz Álvarez, da Fundación Oasis de Amor y Paz.

“Também é comum se ouvir nas esquinas os funcionários de bares (prostíbulos) gritando: ‘Venham comer, senhores. Agora que as venezuelanas custam pouco podemos aproveitar”, acrescenta.

A maioria dos imigrantes chega com a esperança de encontrar algum trabalho, mas não é fácil.

De acordo com o órgão oficial de estatísticas do país, o Sistema Estadístico Nacional de Colombia, Cúcuta é a segunda cidade com maior taxa de desemprego no território – 16,2% em setembro de 2018.

 

DEIXE UM COMENTÁRIO