Por que Bolsonaro não é carta fora do baralho

As ideias e o discurso do deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ) são tão diversos das de boa parte da classe média alta brasileira que parte dos formadores de opinião pode achar que ele é apenas uma piada de mau gosto.

Ou, para alguns dos que se definem como “de esquerda”, a melhor estratégia é a do avestruz: enfiar a cabeça na areia, fingir que ele não existe e torcer para que ninguém mais fale no assunto.

São dois enganos, mostram os exemplos recentes das eleições filipinas e americanas, nas quais Rodrigo Duterte e Donald Trump foram eleitos rezando o mesmo credo que Bolsonaro faz questão de reforçar.

As condições andam propícias para candidatos populistas em vários países do mundo. No Brasil, elas são evidentes—a pior recessão da história, taxa de desemprego acima de 10%, descrença nas instituições, medo do futuro, ressentimento pela esperança perdida.

É nesse caldo que declarações como as de Bolsonaro fermentam rápido. Como Duterte e Trump, o deputado recorre a uma mensagem simples: “Ordem e progresso a qualquer custo”.

“Tem que fuzilar”, “ninguém manda em mim”, “tem que mudar isso aí” são parte da estratégia pela qual os atuais presidentes filipino e americano se elegeram.

Assim como são calculados os palavrões e a agressividade contra os inimigos, dos quais a imprensa costuma fazer parte.

Tanto faz se, para os intelectuais, xingar um embaixador de filho da puta é incompatível com o decoro exigido de um presidente. Quando Duterte fez isso, a população filipina viu apenas uma comprovação de “pulso firme”, a mesma qualidades que o elegeu e que lhe garante a taxa de aprovação acima de 80%.

A figura de alguém resoluto, não influenciável e que cumpre suas promessas encontra respaldo na frustração popular.

E o “vingador”, como é chamado, fez até mais que isso. Num país de esmagadora maioria católica, ele destratou o papa Francisco durante a campanha eleitoral sem qualquer prejuízo.

“Eu quis dizer a ele: ‘Papa, puta que pariu, vá pra casa. Não nos visite mais'”, reclamou, irritado com os engarrafamentos provocados pela visita papal.

Perto disso, frases como “Por isso que essa porra desse país está nessa merda aí”, ditas na entrevista à Folha, são brandas.

Nas Filipinas, a mistura de xingamentos e opiniões controversas trouxe repercussão. Até a reação dos concorrentes virou cilada, pois manteve nele os holofotes.

E, mesmo que os jornais tivessem feito um pacto para ignorá-lo, teria sido inútil. Duterte contratou empresas de relações públicas para amplificar as polêmicas nas redes sociais e contou com grupos de internautas que, espontaneamente, replicaram suas mensagens e reforçaram sua popularidade, contornando os veículos tradicionais.

Para completar a cartilha populista, Bolsonaro já escolheu seu inimigo comum: os bandidos, que ele promete prender, fuzilar ou dopar, de acordo com o momento.

Da mesma forma, Duterte prometeu matar 100 mil drogados e Trump jurou expulsar 3 milhões de imigrantes.

As forças políticas que se opõem à possibilidade de o deputado federal do PSC chegar ao principal cargo do país deveriam levar essa possibilidade a sério. Na batalha populista, nunca é simples nem fácil contra-atacar.

A matéria é de Ana Estela de Sousa Pinto da Folha

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