Reportagem da VEJA: Taiguara Rodrigues dos Santos é filho de Lambari, irmão da primeira mulher do ex-presidente. De pequeno empresário de Santos, ele se tornou milionário graças a privilégios obtidos na agência do governo para o comércio exterior.
Desde a sua fundação, informa o Conselho Regional de Engenharia de São Paulo, ela jamais realizou uma obra no estado. São desconhecidas as razões pelas quais a Exergia de Portugal precisou de um sócio brasileiro, sem nenhuma experiência ou capacidade técnica para ter o gigante Odebrecht como cliente.
O desafio de engenharia na África é grande. O projeto prevê a ampliação em cinco vezes da capacidade de geração de energia da hidrelétrica de Cambambe, localizada no Rio Kwanza, o maior de Angola. Taiguara não quis dizer o que sua empresa agregou ao projeto nem como sua expertise chamou a atenção da Odebrecht. Disse que as perguntas eram “caluniosas” e “desrespeitosas”.
Em março do ano passado, o governo brasileiro organizou uma missão empresarial a Cuba, que foi precedida por uma visita do ex-presidente Lula aos irmãos Fidel e Raúl Castro. A programação oficial previa que os empresários passariam três dias na ilha. O ponto alto seria uma incursão ao Porto de Mariel, cuja obra de modernização é realizada pela Odebrecht, que, como no caso de Angola, conta com financiamento sigiloso do BNDES.
Taiguara vislumbrou uma nova oportunidade — e foi bem-sucedido, graças à ajuda de amigos e amigos de amigos no Ministério do Desenvolvimento. Entre eles, Mônica Zerbinato. Secretária particular de Lula durante mais de uma década e mulher de Osvaldo Bargas, também assessor do ex-presidente, Mônica abriu para Taiguara as portas da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex), o órgão oficial que organizou a missão empresarial a Cuba. Servidora da Apex, ela intercedeu junto aos colegas para que incluíssem o dono da Exergia Brasil na missão. Foi uma costura rápida e indolor.
“Como já havia explicado a Mônica, tenho uma empresa de engenharia no Brasil, e nossa área de atuação está focada na África. Estamos principalmente em Angola e Moçambique”, escreveu Taiguara na mensagem em que apresentou suas credenciais.
Na sequência, ele deixou claro a força de seus apoios: “Devido a várias circunstâncias, temos como principal cliente em Angola a Odebrecht. Na semana passada, fui convidado pelo doutor Alexandrino, da Odebrecht, para ir a Cuba visitar suas obras e, claro, prospectar o mercado como um todo”.
O doutor mencionado é Alexandrino Alencar, diretor da Odebrecht com atuação reconhecida em mercados externos. Alencar foi apontado por um dos delatores do esquema de corrupção na Petrobras como o elo da empreiteira com os operadores do esquema de pagamento de suborno a políticos e funcionários públicos. Antes disso, o executivo aparecera como coadjuvante num enredo protagonizado por Lula.
Foi em 2011, quando o ex-presidente representou o governo brasileiro numa viagem à Guiné Equatorial. Lula levou o “doutor Alexandrino” na comitiva oficial e, depois de uma conversa com o ditador Teodoro Obiang Mbasogo, credenciou a Odebrecht a fazer negócios naquele país, que, coincidência extraordinária, foi tema da escola de samba Beija-Flor, ganhadora do Carnaval carioca neste ano. Só pode ser mesmo coincidência que, entre os 193 países do planeta Terra, a fabulosa tirania de Obiang, amigo de Lula, tenha sido escolhida como tema da Beija-Flor.
Coube ao próprio chefe do escritório da Apex em Cuba, Hipólito Rocha Gaspar, confirmar a inclusão do empresário na excursão. “Taiguara, bom dia. Na missão, consta seu nome como integrante da comitiva da Odebrecht. Chegando, favor entrar em contato com o nosso escritório”, escreveu o servidor. Segundo a Odebrecht, Taiguara nunca prestou serviço à empreiteira em Cuba. Ao contrário do que revela a troca de mensagens, a Odebrecht afirmou que Taiguara nem sequer figurava na relação de seus representantes oficiais.
Em novembro de 2012, a Camargo Corrêa patrocinou uma viagem de Lula a Moçambique. O ex-presidente, depois de encerrar seu mandato, em 2010, disse que dedicaria parte de seu tempo “a vender o Brasil lá fora”. Em outras palavras, empregaria sua influência e seus conhecimentos para ajudar as empresas nacionais a expandir seus mercados no exterior. A empreiteira queria ajuda para destravar negócios no país africano. Quem também estava lá? O onipresente Taiguara, que posou todo prosa para registrar como era majestoso o hotel em que estava hospedado. A Camargo Corrêa informou que nunca teve relação contratual com a Exergia Brasil.
Atualmente, Cuba é o mercado prioritário do empresário Taiguara. “Viva la revolución”, festejou numa rede social. Em novembro passado, ele participou da Feira Internacional de Havana, na qual se mostrou ao lado de Fábio Luís da Silva, o Lulinha. Taiguara e o filho do ex-presidente são amigos.
O site da Exergia Brasil foi, inclusive, criado por uma empresa do primogênito do petista. Em Havana, os dois receberam um tratamento especial de Hipólito Gaspar (veja o quadro ao lado), que reservou dois Mercedes para eles. O custo do aluguel dos carros, segundo o servidor, teria ficado a cargo dos dois convidados. Hipólito também pediu autorização à presidência da Apex no Brasil para reservar um espaço, dentro do estande brasileiro na feira, para que Taiguara e Lulinha se reunissem reservadamente com representantes do governo cubano, o principal comprador no evento.
A direção da agência negou o pedido. Nem Taiguara nem a Exergia Brasil constam da lista oficial de participantes da feira elaborada pela Apex. Mônica Zerbinato, amiga da família, disse que apenas encaminhou os pedidos. A agência não soube dizer quem o empresário representou no evento nem se ele fechou negócios. Taiguara também se negou a fazê-lo. Ele esclareceu que Lulinha estava de férias em Cuba e, ao acompanhá-lo, lhe fazia uma gentileza. A proximidade com o poder em qualquer governo traz vantagens a empresários. Mas, com frequência, traz também problemas. Taiguara e sua Exergia Brasil encarnam as duas faces dessa moeda.