Matéria do G1.
A maior votação proporcional alcançada pela presidente reeleita Dilma Roussef (PT) aconteceu em Belágua, a 280 km de São Luís, na região leste do Maranhão. Na cidade de apenas 6.524 habitantes, 93,93% dos votos válidos (3.558 votos) foram dados à candidata petista enquanto Aécio Neves (PSDB) obteve 230 votos.
Pela segunda vez, Belágua entra no cenário nacional por apresentar índices expressivos. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgados em dezembro do ano passado, o município registrou o maior salto econômico do país, subindo mais de mil posições no ranking de cidades por PIB per capita.
Uma reportagem do G1 mostrou que o maior ganho da população foi sair da situação de pobreza extrema para a pobreza, impulsionada pelos programas de assistência social do governo federal somados à produção artesanal e venda de farinha de mandioca.
Dez meses depois, o G1 voltou a Belágua para saber como está a cidade mais “dilmista” do Brasil e constatou que o cenário é o mesmo. Na maior parte do município, falta saneamento básico, água encanada e pavimentação das ruas, por exemplo, mas a população garante que já foi pior.
Neste mês, segundo a Caixa Econômica Federal, 1.292 famílias cadastradas receberam verba do Bolsa Família na cidade.
Se consideramos a base mínima de 4 pessoas por família utilizada pelo IBGE, o programa beneficia de forma direta aproximadamente 5.168 pessoas, o equivalente a 79,2% da população belaguense.
Dados do IBGE apontam que, em Belágua, a incidência de analfabetismo é de 52,11%. Apenas três ônibus estão na frota local de veículos e dois hospitais públicos municipais oferecem um pequeno leque de serviços de saúde.
A população tem maioria concentrada nas faixas etárias de 5 a 9 anos e 10 a 14 anos. A estimativa é de que, entre 2010 e 2014, o crescimento populacional tenha sido de 667 pessoas, o que leva a população a 7.191 habitantes no total.
Eleitor convicto de Dilma, José Raimundo Nonato Silva, de 51 anos, hoje é dono de um comércio, mas prefere declarar a profissão de lavrador. Casado e pai de três filhos, ele conta que abriu a venda depois do Bolsa Família e afirma que nunca deixou de trabalhar por causa do benefício.
“Sou da roça mesmo. Tenho esse negócio aqui, mas eu faço farinha. Antes do Bolsa Família, eu só vendia farinha. Ela [Dilma] melhorou, tinha muita família que tava passando mal, passando fome.
Agora come direitinho, tem uma coisinha pra comprar no comércio, compra comida, paga roupa”, explica.
Ele admite que muita gente na cidade deixou de trabalhar por causa do benefício e considera a atitude um erro. “Aqui tem muita pessoa que depois que recebeu essa bolsa, parou de trabalhar.
Tá errado. Isso daí é uma ajuda que ela deu pro camarada pra ter mais aquele negócio, pra trabalhar, pra ter mais. Agora, o pessoal pega isso e não quer fazer mais roça, não quer fazer carvão, não quer mais trabalhar?”, protesta.
Questionado se ele consideraria votar no candidato Aécio Neves, Seu José Raimundo é categórico. “De jeito nenhum. Eu não conheço ele, o pessoal dele nunca fez nada aqui pra mim”, revela.
Informado de que algumas pessoas não concordam com os programas do governo, ele disse que gostaria de conversar com alguém que pense assim. “Tem gente que não entende as coisas, né? Eu tinha tanta coisa pra falar pra uma pessoa dessa”, avisa.
Já a lavradora Raimunda Nonata, 34, conta que votou na Dilma, mas não por causa do Bolsa Família. Ela discorda de quem se apega ao benefício e deixa de “produzir riquezas”.
“Nossa cidade é a quarta das mais mal desenvolvida [no estado] e dentro do nosso município tem muitas riquezas.
Existe campo pra pessoa trabalhar, só que, hoje, a gente vê que o próprio pessoal do município não se importa”, reclama.
Para Raimunda, a má distribuição e aplicação de recursos na cidade leva parte da população a necessitar de programas do governo federal para sobreviver.
Ela afirma que o voto na presidente reeleita foi uma segunda chance para a petista mostrar um trabalho melhor.
“Hoje, a gente votou nela [na Dilma] dando uma segunda oportunidade, mas se continuar assim, não vou mais votar nesse partido. A gente vê que tem muito recurso pra pobreza, mas é mal distribuído e quem sofre é o pobre.
Aí, as pessoas se apegam à questão do Bolsa Família, mas o nosso município não pode depender só disso. Tem várias pessoas que não têm oportunidade pra cursar um curso e fazer uma faculdade aqui.
Eu vejo gente que usa isso pra se empenhar, pra levar o filho pra escola, mas nem todas as pessoas têm o bom senso de fazer isso.
Tem gente que quer o anzol, a isca e o peixe, mas tem gente que luta pra pegar o peixe”, acrescenta.
Na casa de barro e palhoça, a água é preciso ser bombeada de um poço e carregada em baldes. O lixo é jogado e incinerado em buracos abertos no quintal, os chamados “barreiros”.
Questionada se ela acredita que é preciso melhorar a qualidade de vida da família, Maria afirma que “sempre pode”, mas que gosta da vida que leva.
“Consigo pagar as contas, mercearia de casa e comprar remédio. Farinha agora a gente nem faz mais. O que meu marido ganha [como pedreiro] já ajuda bastante.
Por isso eu votei na Dilma, porque melhorou, porque, na roça, o serviço é mais pesado e esse é um benefício que a gente ganha sem trabalhar. Ajuda bastante”, revela.
Pesdebista solitária
Entre tantos eleitores de Dilma, o G1 encontrou apenas uma eleitora do Aécio – a estudante Vladerlice Saminez Silva, 20. Ela conta que votou no candidato tucano porque considerou as propostas dele melhores e revela que não foi a única na cidade a pensar assim. Segundo ela, muita gente não votou no opositor a Dilma com medo de perder os benefícios.
“Votei no Aécio porque achei as propostas dele muito melhores do que as da Dilma. Ela fez coisa boa no governo, mas deveria ter feito mais. Principalmente na segurança e, analisando o debate, achei as propostas dele muito melhores”, disse.
Para Vladerlice, a alternância de governantes no poder seria positiva para o país. “A maioria das pessoas votou nela por causa do Bolsa Família, com medo de perder, mas a gente não tem que pensar não só na gente, mas no país em si e foi isso que eu fiz. Se a pessoa não faz nada, a gente muda. Se ele não fizesse nada, a gente mudava de novo. E assim vai, até a gente encontrar alguém que realmente se importe com o país”, conclui.