“A saúde é direito de todos e dever do Estado”, diz o artigo 196 da Constituição da República Federativa do Brasil.
Apesar da regra ser geral, há necessidades específicas decorrentes de doenças que exigem direitos especiais, como alguns que são garantidos aos pacientes com câncer.
O principal é o direito de ser atendido integralmente pelo Sistema Único de Saúde (SUS), desde os exames para o diagnóstico até receber medicamentos e tratamento completo.
Uma das conquistas dos pacientes foi a promulgação da Lei 12.732, que ficou conhecida como Lei dos 60 dias e determina que o tratamento deve ser iniciado em até 60 dias após o diagnóstico de câncer.
“Essa lei é resultado de políticas públicas efetivas, conseguida com a união de várias associações de oncologia”, esclarece Andrea Bento, advogada especialista em Direitos dos Pacientes com Câncer, colaboradora do Instituto Vencer o Câncer (IVOC).
Ela explica que políticas públicas acontecem quando pessoas se unem para mudar o cenário político do país, seja em educação, saúde, direitos humanos. “Essa é a importância das pessoas se juntarem para convencer um tomador de decisão, um governo a acolher sua luta”.
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Andrea destaca que apesar de grandes conquistas, ainda há muitas demandas dos pacientes que precisam ser atendidas. Cita como uma das mais urgentes, além de garantir acesso aos novos medicamentos, a necessidade de que os exames sejam feitos em 30 dias.
“Hoje há grandes filas de espera para realizar exames que vão possibilitar o diagnóstico. Sem isso, não é possível determinar o início do prazo para o tratamento. Infelizmente, o SUS sofre graves problemas de financiamento e gestão e faz com que o paciente com câncer enfrente várias barreiras.
Por isso a importância das associações de pacientes gerarem Políticas Públicas para melhorar esse cenário, como provocar o Legislativo para criar leis que determinam prazo de atendimento e realização de exames”.
“Por isso é tão importante a participação do cidadão, independente se ele tenha ou não diagnóstico de câncer. Todos podem, através da mobilização, alterar as políticas públicas para que outros tenham acesso”, destaca Rita Domingues, diretora do IVOC.
Uma das formas de atuar é participando das consultas públicas realizadas pelo Conitec, órgão que fiscaliza e analisa as tecnologias que vão fazer parte ou não da cobertura do SUS. “Essas consultas são feitas para que a sociedade se manifeste sobre o interesse de determinado medicamento entrar no rol de cobertura do SUS – ou seja, precisa haver interesse das pessoas nos remédios, para que eles fiquem disponíveis à população pelo Sistema Único”, complementa Rita.
Garanta seus direitos
Um ponto importante para levar em conta antes de exigir os direitos é saber a quais deles o paciente tem realmente direito ou não. “Os direitos vão depender do laudo médico, se a pessoa é portadora de um câncer que a impeça de trabalhar ou tem alguma limitação que exige necessidades especiais em um carro, por exemplo.
Os direitos dependem da limitação de cada paciente”, avisa a advogada. Caberá sempre ao paciente ter todos os documentos que comprovem sua condição para exigir seus direitos.
Por isso, Andrea recomenda: assim que receber o diagnóstico, organize uma pasta com toda a documentação que será necessária.
A pasta deve ter RG, CPF, comprovante de residência, laudo médico atualizado, comprovante dos exames realizados e do CID da neoplasia maligna – o melhor é ter uma cópia, pois os originais são para uso do paciente.
“É essencial também retirar o prontuário médico na instituição em que faz tratamento e guardar nessa pasta. O paciente tem direito a uma cópia dos documentos do hospital”.
Andrea avisa que se um direito do paciente é negado, ele pode procurar um advogado ou a defensoria pública. “Na defensoria pública o paciente terá garantido seu direito a um advogado gratuitamente”.
Outra sugestão importante: procurar o Ministério Público quando o município ou o estado não estão cumprindo seu papel. “Por exemplo, quando o medicamento necessário faz parte da lista do SUS, mas está em falta na farmácia popular, deve-se procurar a Ouvidoria do SUS ou a Secretaria Estadual de Saúde e informar o que acontece. Se nenhuma providência for tomada, buscar ajuda no Ministério Público e, se for preciso, entrar com uma ação judicial.
O paciente também pode buscar apoio em associações, falar com o assistente social do município e com seu médico”.
Como fazer para ser atendido no SUS
1- Deve-se cadastrar na UBS – Unidade Básica de Saúde mais próxima de sua residência. Para adquirir um cartão SUS basta apresentar um documento de identidade e comprovante de residência em qualquer posto básico de saúde.
2- Caso precise de atendimento, é importante que procure primeiro um dos serviços de atenção primária do SUS, como os Postos de Saúde, UBS ou USF – Unidades de Saúde da Família. Para os casos de pronto atendimento, que não necessitam de agendamento ou internação, também estão disponíveis as AMAs – Atendimento Médico Ambulatorial.
3- Em situações de urgência e emergência, vá direto ao Pronto Socorro mais próximo de sua residência com o cartão SUS.
4- Se houver necessidade, será encaminhado para os AMEs – Ambulatórios de Especialidades, Hospitais Gerais ou nos Hospitais Especializados.
Direitos dos pacientes com câncer
- Ter uma segunda opinião médica.
- Fazer exames e ser diagnosticado em tempo de ser tratado.
- Receber os medicamentos ligados direta ou indiretamente ao tratamento de câncer – existe uma relação dos remédios disponíveis tanto pelo SUS quanto pelas operadoras de saúde. Paciente que faz tratamento via plano de saúde ou particular também tem direito a obter medicamentos pelo SUS.
- Mama – mulheres têm direito a mamografia a partir dos 50 anos e a paciente que precisar fazer retirada da mama tem direito à reconstrução. Pacientes com mutação comprovada e alto risco de desenvolver câncer de mama têm direito à cirurgia preventiva de retirada e reconstrução.
- Quando o médico indica internação domiciliar, o paciente pode solicitar ao SUS ou ao seu plano de saúde ser atendido em casa pela equipe de saúde.
- Todos que recebem diagnóstico e têm carteira profissional assinada a partir de 5/10/98 podem sacar o saldo do FGTS. Também podem sacar o FGTS pais cujos filhos menores de 21 anos sejam diagnosticados com câncer. Informações e agendamento na Caixa Econômica Federal (telefone 146).
- Pacientes de câncer com dificuldades para esperar em locais públicos por conta da imunidade baixa têm atendimento preferencial em estabelecimentos comerciais.
- Pacientes inscritos no INSS com incapacidade temporária para o trabalho têm direito ao auxílio-doença após 15 dias do afastamento do trabalho. A primeira quinzena é paga pela empresa. Necessário agendar perícia na Previdência Social (telefone 135) e levar o laudo médico atualizado com o CID. Se o pedido for negado, é possível recorrer em 30 dias.
- Quando a incapacidade não é temporária, ou seja, o paciente não poderá mais voltar ao trabalho, pode solicitar aposentadoria por invalidez. Se for negada, cabe recurso no prazo de 30 dias.
- As despesas com médicos, exames, hospitais, planos de saúde e compra de próteses e órteses podem ser deduzidas do Imposto de Renda.
Isenções
Quanto às isenções, é preciso considerar não apenas as regras nacionais, mas as leis dos municípios e estados em que o paciente vive. Cada direito deve ser solicitado em seu respectivo órgão.
- IPTU – cada município tem uma definição em sua legislação que pode conceder isenção aos pacientes em alguns casos. Precisa verificar na prefeitura da cidade.
- ICMS – cada estado tem uma legislação – há situações, como em São Paulo, em que o governo concede isenção na compra de veículos especiais ou adaptados conduzidos apenas por deficientes físicos.
- IOF – imposto cobrado em financiamentos e empréstimos. Pacientes com invalidez por causa do câncer estão isentos desse imposto para compra de carro especial ou adaptado.
- IPI – pacientes com invalidez decorrente da doença têm isenção do IPI para comprar automóvel, considerando algumas especificações sobre o tipo de veículo.
- IPVA – a lei varia de estado para estado. Em São Paulo, pacientes com invalidez têm isenção.
- IR – aposentados e pensionistas com câncer têm direito à isenção do Imposto de Renda sobre os rendimentos de aposentadoria, reforma e pensão, mesmo que a doença tenha sido diagnosticada depois da aposentadoria. Importante: mesmo com a isenção é preciso fazer a declaração de renda. Quem se aposenta, mas continua trabalhando e tem salário, tem incidência de IR normalmente sobre o salário.
Locomoção
Para ter direito a desconto nos impostos para compra de veículo especial ou adaptado, o paciente precisa ter comprovada limitação física que necessite do veículo especial. Além da indicação médica, passará por uma perícia no departamento de trânsito para caracterizar a incapacidade.
Depois será preciso providenciar a Carteira Nacional de Habilitação Especial, que especificará a adaptação necessária para que dirija com segurança. Se não tiver condições de dirigir, poderá apresentar até três motoristas autorizados.
Em cidades grandes que adotam rodízio de veículos, como São Paulo, os pacientes podem circular livremente. Com a carteira de deficiente o paciente com incapacidade pode estacionar seu veículo nas vagas especiais destinadas a esse fim.
Os pacientes também têm direitos especiais no transporte público, seja municipal ou intermunicipal e interestadual, chamado TFD – transporte fora do município. Sempre que o tratamento é feito a mais de 50 km de sua residência, tem direito ao TFD.
Em alguns casos o município disponibiliza veículos para fazer o transporte. Quando não, o paciente tem direito ao reembolso de acordo com uma tabela com valores para transporte, alimentação e, dependendo do local, hospedagem.
Para deslocamento dentro da própria cidade ou região, o paciente tem gratuidade no transporte público para fazer o tratamento, com laudo médico demonstrando quantos dias ele fará sessões para se tratar. O benefício deve ser solicitado em cada órgão responsável pelo transporte, seja ônibus, metrô ou trem.
Telefones importantes
- Ouvidoria do SUS: 136 – para reivindicações não atendidas, por exemplo quando não tem acesso aos medicamentos, consultas ou longa fila de espera para realização de exames.
- Previdência Social: 135 – para agendar perícia médica e obter outras informações.
- Caixa Econômica Federal: 146 – solicitar saque do FGTS.
- ANS – informações sobre planos de saúde, rol de medicamentos e procedimento e reclamações – 08007019656.