Por que sou a favor da redução da maioridade penal

Sou defensor intransigente dos direitos humanos, direito de todos. Possuo um exemplar da redação final da Carta de 1988, entregue pelo deputado federal constituinte Sérgio Spada. Com 245 artigos, ela é considerada completa; entretanto, na minha humilde opinião, ela é redundante, com excesso de definições que atrapalham a aplicação de seus princípios. Um desses excessos é a maioridade penal, que até 1988 não ocupou nenhuma das Constituições brasileiras, sendo sempre matéria penal e de Código de Menores.

É um exagero dizer que o artigo 228 da Constituição Federal é cláusula pétrea, quando ele nem precisaria existir. Mas, já que está, precisa ser reformulado. Primeiramente, não entendo como a impunidade pode ser considerada defesa dos direitos humanos, condição essencial para ser considerada cláusula pétrea.

A redação final da emenda ainda poderá sofrer modificações e, depois, para viger, exigirá alterações na legislação penal e no Estatuto da Criança e do Adolescente, pois o artigo 228 da CF é uma norma constitucional de eficácia limitada, exige regulamentação.

Sempre acreditei que não são as leis que mudam a sociedade, mas a sociedade que modifica as leis. A maioria da população brasileira é a favor da redução da maioridade penal. Nove em cada dez brasileiros são favoráveis a leis mais duras para punir adolescentes que cometem crimes. É o que revela uma consulta popular realizada pelo instituto Paraná Pesquisas nas cinco regiões do país e publicada na Gazeta do Povo de 14 de julho de 2013.

A maioria dos especialistas diz que os menores já são “punidos”, que a internação é rigorosa, entre outros argumentos. Não é verdade; os adolescentes estão sujeitos a medidas socioeducativas e somente serão internados em caso de crimes violentos. Pior, ao completarem 18 anos terão ficha absolutamente limpa, por nunca terem cometido nenhum crime. Com a mudança proposta, os crimes cometidos a partir de 16 anos contam para fins de reincidência e serão necessárias melhorias no sistema penitenciário, pois há exigência em tratados internacionais de que os adolescentes sejam presos em estabelecimentos juvenis (16 a 21 anos).

Além disso, diminui o aliciamento de menores para cometer crimes, pois, infelizmente, hoje o menor que comete crimes não violentos não está sujeito à internação, e um dos principais argumentos dos aliciadores é que, para os menores, “não dá nada”.

Sempre acreditei que não são as leis que mudam a sociedade, mas a sociedade que modifica as leis

A PEC 171/93 é, na verdade, uma adequação constitucional que permitirá punir os crimes eleitorais, de conscritos e de emancipados, quando cometidos por pessoa entre 16 e 18 anos, autorizadas a praticar os atos, mas ainda inimputáveis.

Se um menor com mais de 16 anos casar e cometer violência doméstica, com essa adequação constitucional poderá ser punido pela Lei Maria da Penha. Afirmar que a cadeia não resolve para os adolescentes é negar a capacidade ressocializante do sistema penitenciário, é admitir a completa falência do sistema penitenciário brasileiro.

Em seu voto pela admissibilidade, o deputado Capitão Augusto afirmou: “Ressalta-se que países signatários do Pacto de San José da Costa Rica, como Chile, Argentina e Bolívia (onde a maioridade penal é estabelecida em 16 anos) ou México (onde, de acordo com a unidade da federação, a idade mínima pode variar entre 6 e 12 anos, sendo na maioria fixado em 11 ou 12 anos), estão em plena concordância com ele. O Brasil é um dos poucos países que adota o critério puramente biológico para definir o momento a partir do qual alguém possa ser responsabilizado criminalmente, enquanto todo o mundo moderno utiliza o biopisicológico”.

Claro que a emenda constitucional não resolve o problema; a impunidade não é questão legal, é problema de aplicação da lei. Uma das desvantagens de a PEC basear-se em cronologia e não em entendimento do caráter criminoso e na capacidade do jovem em responder por seus atos poderá ser resolvido em legislação infraconstitucional.

A legislação do Império e da Primeira República definia a maioridade penal aos 14 anos, talvez pela influência do “Golpe da Maioridade”, quando Dom Pedro II, aos 15 anos, foi declarado maior de idade, para assumir o cargo de Imperador Constitucional e Defensor Perpétuo do Brasil. Assim, se um jovem com 15 anos podia decidir os destinos da nação, declarar guerra e paz, era difícil não reconhecer a capacidade de responder por seus atos a partir dos 14 anos.

Gazeta do Povo: César Alberto Souza, oficial da reserva da PMPR, foi subcomandante geral da PM e coordenador das UPS em 2012. É diretor de comunicação da Amai e professor de Polícia Comunitária e Direitos Humanos no NPSPP – UTP e Uninter, tendo lecionado na Escola Superior de Polícia Civil e na Academia de Polícia Militar do Guatupê.

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