Era uma vez, uma estranha época em que os jornalistas opositores ao regime não podiam exercer a nobre arte do jornalismo, tampouco os juristas e operadores do direito tecer comentários. Nesta época, não há liberdade plena, mas não se resume somente aos profissionais da imprensa ou do direito, pois o regime vai atrás de qualquer um que se oponha a ele, até influenciadores digitais.
Naquela época, as pessoas tinham medo de falar qualquer coisa daqueles que estavam no poder. Quem se arriscava a falar sobre perseguições, parcialidade e autoritarismo recebiam uma visita de agentes do Estado em sua porta. Homens de preto com óculos escuros e semblantes sérios os levavam ou entregavam um tipo de comunicado que fazia as pessoas tremerem!
Os que tinham sorte apenas eram incluídos em investigações intermináveis, nas quais os próprios advogados das pessoas investigadas não tinham acesso. Nesta época, isto é contra a constituição! Naquela, isso era ilegal! Nesta época, a democracia está sendo subvertida! Humm! Era (ou é) melhor dizer que nada disso estava ocorrendo, até que este ou aquele Estado de Exceção passasse e todos pudessem ser livres novamente.
Era uma vez um lugar, onde os donos do poder, ao falar aos jornais alinhados à situação, diziam que estavam defendendo a democracia e o estado de direito mesmo violando aquilo que diziam defender e muitos acreditavam. Aquilo lembrava os nazistas quando iam executar suas vítimas nas câmaras de gás, diziam que eles iam pra um lugar melhor (ao buscá-los nos campos de concentração). Ao chegarem às câmaras de gás, as vítimas viam chuveiros no teto, reforçando a ideia de que iam apenas tomar banho antes de irem a um “lugar melhor”. Também colocavam músicas típicas dos judeus, pra que não desconfiassem de nada.
Assim como os nazistas faziam, o poder autoritário, nesta ou naquela época, também convencia aqueles que o aplaudiam de que todos iriam ficar bem, que era só pra defender a “democracia”.
Já que “democracia” pros extremistas era um país onde só eles pudessem ter vez e voz, pudessem criticar ou mesmo escrever um artigo de opinião, aplaudiam com visível empolgação (quase emocionados) quando um adversário político ou um jornalista que criticava o regime eram presos. Os que tinham sorte apenas eram incluídos em investigações intermináveis, como forma de coagir e manter o indivíduo sob intensa pressão e medo. Era pro bem da “democracia”, diziam!
Nesta época, os grupos que se dizem defender os direitos humanos também se calam, uns por estar do lado que oprime e prende, outros por temerem ser oprimidos e presos. Mas, naquela época, ainda havia um congresso funcionando, sim! Eles falavam na tribuna, faziam reuniões e realizavam suas comissões sobre projetos de leis, sim! Tanto estava funcionando que um dia um grupo de parlamentares resolveu tentar frear aquele Estado de perseguição que havia contra adversários políticos. Mas, dizia-se por aí, nos corredores do estranho país onde isso acontecia, que os parlamentares insurgentes receberam telefonemas e até visitas de pessoas estranhas nos seus gabinetes. Homens de preto com óculos escuros e semblantes sérios!
Naquela época, aqueles parlamentares já não estavam mais dispostos a enfrentar o regime, pois àquelas alturas até deputado federal já havia sido preso, outro cassado e tantos outros coagidos e censurados. Já havia pessoas fugindo do país como jornalistas e até humoristas, por não haver imparcialidade do regime que os perseguia.
Assim, os autoritários continuavam no poder sem muita resistência, uma vez que as prisões ocorriam sob total silêncio daqueles que podiam fazer algo, mas não faziam.
Nesta época, até os parlamentares eleitos pelo povo têm medo, isso mesmo. O povo, que é a matéria prima da democracia, não tem mais seus representantes com liberdade pra falar dos assuntos que lhes são caros, uma vez que a “democracia” está sempre de olho, na espreita, esperando uma fala que sirva pra ser distorcida e assim, os homens de preto apareçam de repente e os levem às prisões. Pra isso os chamam de “antidemocráticos” na falta de crime real pra justificar suas prisões.
Era uma vez, uma época estranha em que uma mera crítica podia se tornar um crime de “fake news”, mesmo que não houvesse (também) este crime em nenhuma lei, pessoas podiam ser presas ou processadas sem ao menos saberem do que estavam sendo acusadas.
Era uma vez, naquela ou nesta época, jornalistas e veículos de comunicação sendo censurados pelo Estado autoritário, pessoas escolhendo palavras ao falarem na televisão e internet por terem medo de ser presas ou processadas pela “democracia”, um tipo de “democracia” que um dia levou embora milhões de pessoas na Alemanha nazista e nunca mais as trouxe de volta.
Naquela época, também, as coisas começaram assim, de forma muito estranha e sempre se dizendo estar fazendo o que era certo. Diziam que estavam defendendo a democracia contra o mal, contra fake news, quando estavam levando todos pra um lugar com chuveiros no teto, mas sem água nenhuma. Naquela ou nesta época?